Capítulo 1
17 de abril de 2025 às 09:56
Itachi estava diante do fogão, vestindo um avental branco que Deidara, alguns anos atrás, havia tentado decorar com padrões bonitos. Por ter preguiça de ler as instruções e ignorar a técnica correta de aplicação, a tinta escorreu e o desenho acabou parecendo manchas coloridas e indefinidas. Apesar da pintura fracassada, aquele avental se tornou o presente de Dia dos Namorados mais querido para Itachi. E com ele, mesmo já sendo naturalmente cuidadoso, Itachi cozinhava com ainda mais zelo. No início, evitava usá-lo, querendo preservá-lo. Mas Deidara ficava constantemente desapontado, lamentando sua falta de jeito, sem acreditar que Itachi realmente tivesse gostado daquele presente. Por isso, desde então — e como hoje — o Uchiha estava ali, diante do fogão, com aquele mesmo avental branco que Deidara havia tentado pintar…
Virando panquecas fofas na frigideira quente, Itachi ouviu passos cautelosos. Deidara apareceu na entrada da cozinha e parou ali, hesitante.
— Quem é você? — a voz de Deidara tremeu levemente, traindo sua ansiedade e confusão.
Itachi se virou, inclinou um pouco a cabeça e, com um sorriso suave, respondeu:
— Sou seu novo cozinheiro, senhor Tsukuri.
Deidara o observava com interesse visível e certa desconfiança.
— Senhor Tsukuri… sou eu? — ao perguntar isso, Deidara levou a mão ao peito. Parecia completamente perdido, e sua expressão apertou o coração de Itachi.
— Sim, você é o senhor Deidara Tsukuri, e eu sou Itachi, o cozinheiro. O senhor me pediu panquecas com geleia de cereja e cacau para o café da manhã. — O Uchiha colocou com cuidado algumas panquecas em uma metade do prato, preenchendo o restante com geleia. — Por favor, sente-se à mesa, o café já está pronto.
Deidara se sentou devagar na cadeira, sem tirar os olhos de Itachi, que colocou diante dele o prato e os talheres.
— Me desculpe… — murmurou Deidara, mal movendo os lábios, — não me lembro de nada…
— Eu sei disso — informou Itachi. — Recentemente o senhor foi atropelado e, infelizmente, como consequência do trauma, perdeu a memória.
Deidara franziu o cenho e tocou a testa com a ponta dos dedos, tentando recordar alguma coisa.
— Eu atravessei a rua sem prestar atenção, no sinal vermelho. Foi você, senhor Tsukuri, quem literalmente me salvou, conseguindo me empurrar para longe do carro que se aproximava. Mas acabou se ferindo. Os médicos dizem que sua memória logo vai voltar. Enquanto isso, em agradecimento por ter me salvado, vou trabalhar para você como cozinheiro particular, de graça.
Deidara ficou um tempo em silêncio, digerindo a informação recebida. Por fim, como se aceitasse mentalmente o que ouvira, assentiu com a cabeça e disse:
— Itachi, vamos falar de forma informal.
— Tudo bem — Uchiha sorriu amplamente — Senhor… Quero dizer… Você precisa comer…
Deidara engasgou com não se sabe o quê e olhou para Itachi, confuso.
— S-senhor? Qual foi o nome que você disse que eu tenho?
— Deidara — lembrou o “cozinheiro”.
— Então me chame pelo nome… E por que você não está comendo? Precisa ir embora?
— Você disse que queria que eu morasse com você — Itachi pegou outro prato e, montando seu próprio café da manhã, sentou-se à mesa, de frente para Deidara. — Mas se você mudou de ideia, eu vou embora. Não tem problema, eu moro sozinho.
— Sozinho? — Deidara inclinou a cabeça para o lado e voltou a observar Itachi com atenção. Os olhos escuros do moreno transmitiam calor, e cada movimento seu era confiante, mas suave. Havia algo nele que despertava em Deidara uma simpatia imediata e uma confiança quase instintiva. Mas por mais que Tsukuri tentasse, não conseguia se lembrar de nada — nem de si mesmo, nem daquele rapaz chamado Itachi.
— Bom… já que você vive sozinho… — disse Deidara, pensativo — então talvez seja mesmo melhor você ficar comigo…
— Como isso aconteceu? — sussurrou novamente Tsukuri, como se falasse consigo mesmo.
Quando terminaram o café da manhã, Deidara olhou para seu prato e perguntou se havia uma máquina de lavar louça na casa, surpreendendo Uchiha. Normalmente, o loiro nunca se preocupava com o destino da louça suja, deixando para Itachi o direito de lidar com isso sozinho.
— E agora, o que vamos fazer? — perguntou Deidara.
— Eu preciso decidir o que vou preparar para o almoço e o jantar. Você não me disse o que gostaria de comer.
— Eu quero… — Deidara pensou em várias opções, mas já que tinha diante de si um verdadeiro chef, fazia sentido pedir algo especial, — peixe assado… vermelho… talvez truta ou salmão… com molho tártaro. E carbonara.
Essa resposta surpreendeu Itachi. Ele tinha certeza de que Deidara pediria como sempre pizza, batata frita ou sorvete. E agora descobria que, mesmo conhecendo Tsukuri há alguns anos, não fazia ideia de que ele gostava de carbonara. “Afinal, ser cozinheiro tem suas vantagens”, pensou Itachi, e em voz alta disse:
— Ótimo! Nesse caso, preciso comprar alguns ingredientes que estão faltando. Você vai comigo?
Os dois passaram bastante tempo passeando pelo supermercado, que ficava dentro de um enorme centro comercial. Quando tudo o que precisavam foi comprado e cuidadosamente guardado na mochila, Deidara se lembrou de que o avental que Itachi usava pela manhã estava manchado de tinta. Apesar dos protestos do Uchiha, ele o arrastou pelo shopping à procura de uma lojinha onde pudessem comprar um novo avental para cozinhar. Depois de puxar Itachi por uns duzentos metros, Deidara percebeu que não fazia ideia de para onde estava indo. Sem pensar muito, ele pediu ajuda a dois seguranças que passeavam calmamente perto dos elevadores.
— Vocês poderiam me dizer onde posso comprar um avental por aqui?
Um dos seguranças fez uma careta, pensando na resposta, e então disse:
— Sim, eu conheço uma lojinha assim, mas ela fica em outra parte do complexo. Para chegar lá, vocês precisam passar pelo terceiro andar e depois descer de novo ao segundo — ao notar a expressão confusa no rosto de Deidara, ele acrescentou, — Venham, eu mostro o caminho.
Os garotos subiram pelo elevador junto com o segurança e depois o seguiram por uma longa galeria de pequenas lojas de roupas. Ao tropeçar num chão completamente liso, Tsukuri acabou chamando a atenção de seu acompanhante. Itachi notou em seu rosto uma expressão já dolorosamente familiar — confusão e desorientação. Quando o olhar do loiro encontrou o dele, Uchiha disse baixinho:
— Você esqueceu tudo de novo? Eu sou Itachi, seu melhor amigo.
Deidara encarou atentamente o rosto do moreno, mas, sem se lembrar de nada, desviou o olhar para as costas do segurança.
— Por que estamos seguindo ele?
Itachi apontou com o polegar para a mochila nas costas e, inclinando-se para o ouvido de Deidara, sussurrou:
— A gente tentou roubar um pouco de comida pra não morrer de fome, mas nos pegaram, e agora estão levando a gente pra resolver isso. Provavelmente vão chamar a polícia…
Enquanto inventava essa bobagem em voz baixa, Itachi sentia um leve arrepio gostoso na bochecha provocado pelos cabelos de Deidara. E quando terminou de falar, não resistiu e inalou discretamente aquele cheiro tão familiar e agradável que vinha sutilmente do loiro.
Ao ouvir aquilo, os olhos de Deidara se arregalaram e uma expressão de desconfiança passou por seu rosto. Piscando lentamente, ele encontrou o olhar atento de Itachi.
— A gente estava mesmo sem dinheiro nenhum?
— Tivemos que gastar os últimos pra termos onde dormir hoje — respondeu Uchiha, dando de ombros com um ar de culpa.
Deidara não sabia se podia confiar naquele homem e começou a procurar a resposta nos olhos dele. Eram escuros e envolventemente calorosos, brilhavam com interesse, ternura e tinham um quê de tristeza... ou talvez cansaço. Tsukuri decidiu que alguém que o olhava daquele jeito, com certeza era digno de confiança.
Então, Deidara mesmo se aproximou do ouvido de Itachi e sussurrou:
— Vamos fugir dele.
No instante seguinte, sentiu a mão de Uchiha segurando levemente seu cotovelo, o fazendo andar mais devagar. Em seguida, os dois se viraram e começaram a caminhar na direção oposta. O segurança pareceu perceber que ninguém o seguia e, ao se virar, gritou:
— Esperem! Não é por aí!
Rapidamente, os garotos dobraram por um pequeno corredor entre as galerias, correram e entraram na primeira loja que encontraram, se escondendo atrás de um longo balcão de camisetas. Ali, tentavam recuperar o fôlego e trocavam olhares cúmplices. Os olhos de Deidara brilhavam com malícia e em seus lábios brincava um sorriso travesso e contagiante. Um sorriso tão suave e bonito que Itachi mal conseguiu resistir à vontade de tocá-lo com os próprios lábios ou ao menos com a ponta dos dedos.
Através da vitrine de vidro, os fugitivos viram o segurança parar confuso perto de onde estavam escondidos. Ele deu algumas voltas no mesmo lugar, claramente sem saber o que fazer, e depois foi embora.
Saindo da loja sob os olhares desconfiados e intrigados dos vendedores, Itachi conduziu Deidara em direção à saída do shopping.
— Pra onde vamos agora? — Nos últimos meses, Deidara se comunicava quase exclusivamente por meio de perguntas, e Itachi já o chamava mentalmente de “o perguntador”.
— Pra casa, fazer carbonara.
— Hmmm, eu adoro carbonara. A gente se conhece há muito tempo?
— Desde a infância — mentiu Itachi mais uma vez, sentindo uma leve frustração por ver como uma mentira aparentemente inofensiva já havia se tornado um hábito.
— E por que eu não me lembro de você?
Itachi já tinha respondido essa pergunta dezenas de vezes, e nunca com a verdade — porque nem ele próprio sabia. E, como sempre, respondeu:
— Você sofreu uma lesão séria na cabeça e, às vezes, perde a memória.
De volta em casa, caiu sobre Itachi uma nova onda de perguntas:
— A gente era da mesma turma?
— Sim.
— Eu era um bom aluno?
— Sim.
— Melhor que você?
— Sim — sorriu Itachi abertamente — Você era o melhor de todos, chegou até a representar a escola na olimpíada intermunicipal.
— Uau! — exclamou Deidara com admiração — E eu tinha amigos? Além de você, claro.
— Claro — Itachi anotou mentalmente perguntar sobre os anos escolares quando o garoto recuperasse a memória — e a garota mais bonita da escola era apaixonada por você.
— Eu era tipo um nerd certinho?
— Ah, você era um verdadeiro encrenqueiro! Mas os professores te adoravam e sempre acreditavam na sua inocência, então tudo acabava passando em branco.
Enquanto Deidara ouvia com atenção as histórias inventadas sobre sua infância, Itachi lhe deu a tarefa de cortar o bacon para a carbonara, enquanto ele próprio se ocupava da massa e do molho. Claro, Uchiha estava longe de ser um chef, mas o conhecimento de alguns princípios básicos de cozinha e a ajuda da internet permitiam que ele preparasse algo bem comível.
Quando quase todo o pedaço de bacon já estava cortado, Deidara soltou um gritinho e imediatamente atraiu a atenção de Itachi. Uma pequena gota de sangue escorria de um corte no dedo indicador.
Itachi sacou, como se fosse do nada, um kit de primeiros socorros e começou a cuidar do ferimento. Deidara observava, um tanto distante, como Itachi limpava com rapidez e, ao mesmo tempo, com todo o cuidado — limpava, passava pomada, soprava, limpava de novo, preparava o curativo...
E, lembrando das poucas horas da sua vida que conseguia recordar, Deidara mergulhou em pensamentos. Sentia que Itachi não era apenas seu melhor amigo — ele parecia alguém ainda mais próximo, alguém em quem se pode confiar absolutamente tudo...
Nessa altura, Uchiha já tinha terminado o curativo e, ao perceber que Deidara estava pensativo demais, deu um leve toque com o dedo na ponta do nariz dele. O loiro se assustou levemente e, como se despertasse, voltou a falar:
— Você disse lá no shopping que às vezes eu perco a memória… com que frequência isso acontece?
Será que Itachi podia dizer que isso acontecia uma, às vezes até duas vezes por dia, já fazia um mês? Sim, uma vez ele contou a Deidara como as coisas realmente estavam. E nunca mais na vida queria ver aquela tristeza e desespero nos olhos que tanto amava. Deidara se chamou de fardo, de inútil, e implorou para ser deixado no hospital mais próximo. Afinal, segundo ele, já não tinha vida — todo dia ela recomeçava do zero — e, por causa da sua condição, ele também tirava a vida de Itachi, que era obrigado a ficar ao seu lado o tempo todo.
— Não é frequente. Não se preocupa, isso logo vai passar — respondeu Itachi com toda a calma e sorriu de forma encorajadora. — Amanhã a gente vai ao médico e conversa com ele sobre isso. Tenho certeza de que tudo vai dar certo.
Depois do almoço, os dois reassistiram aos filmes preferidos do Deidara — que, é claro, ele não se lembrava de ter visto. Itachi observava com interesse como o rapaz comentava os momentos surpreendentes da história, mesmo sabendo que era a quarta vez naquele mês que discutiam exatamente aquele filme. Claro que Deidara não dizia nada de novo, então Itachi não prestava muita atenção nas palavras. Ele aproveitava o entusiasmo e as expressões do loiro, observando cada movimento dos lábios e dos cílios. Às vezes, Uchiha se sentia um pervertido, por nutrir sentimentos fortes e desejo por um garoto que não desconfiava de nada. Mas era obrigado a esconder tudo isso, contentando-se apenas com o prazer estético de observá-lo — ou com outras coisas, como o cheiro, a voz e os toques passageiros.
Na sala dos médicos, tudo era bem iluminado. As luzes brancas faziam brilhar as paredes, o teto e os móveis claros daquele espaço amplo. Itachi sentou-se de frente para o médico, com uma única pergunta:
— Há alguma melhora?
— Hmm... — murmurou Orochimaru, sem demonstrar o menor interesse na conversa, — ainda é cedo pra dizer. Quando sair o resultado do exame de hoje, poderei ser mais preciso.
A porta do consultório se abriu devagar, e uma enfermeira corada, com alguns fios de cabelo escapando do gorro, entrou falando com indignação:
— Aquele doutor de outro setor não quer deixar a gente usar a sala do ECG! Senhor Orochimaru! Ele simplesmente se recusa a me ouvir! Dá uma bronca nele, por favor!
Revirando os olhos, o médico se levantou da cadeira e, soltando um suspiro pesado, saiu para o corredor, passando pela enfermeira que rapidamente pulou para o lado.
— Você pode ficar aqui um instante, tá? — disse ela, acenando apressada para Itachi antes de sair e fechar a porta atrás de si.
O fato de que o computador sobre a mesa estava ligado chamou imediatamente a atenção do Uchiha. Em poucos segundos, ele já estava inclinado sobre a mesa do lado do médico, clicando apressadamente com o mouse enquanto folheava laudos e relatórios. E então encontrou algo que jamais esperava descobrir.
Ao voltar para o consultório, Orochimaru arrancou o mouse das mãos de Itachi e, com um único clique, fechou todas as janelas da tela. Mas já era tarde demais. Itachi levantou os olhos para ele, com um olhar cheio de horror e incompreensão.
— Então quer dizer que ele não está doente, e tudo o que está acontecendo agora é efeito de um medicamento que você está administrando? — Itachi se endireitou devagar.
— Fico feliz que saiba ler, mas ler prontuários confidenciais é antiético e proibido por lei segundo o sigilo médico — respondeu o médico, dando alguns passos para o lado, contornando a mesa e parando, encarando a janela com indiferença.
— Você está fazendo um experimento horrível com uma pessoa! Isso é legal!?
— Do ponto de vista legal, estou cumprindo todos os requisitos necessários. O próprio paciente concordou com o estudo e assinou o contrato. Você não tem o direito de julgar ou criticar a decisão dele.
— Ele nunca teria aceitado isso em sã consciência! — Itachi bateu com a palma da mão na mesa, fazendo Orochimaru finalmente olhar para ele. Nos olhos do homem de jaleco branco brilhou um leve sarcasmo.
— Pelo visto, aceitou.
— Como se cancela essa pesquisa?
— Não se cancela — respondeu Orochimaru, abrindo levemente as mãos. — O processo já começou, agora é só esperar o desfecho.
— Que vai transformá-lo num vegetal incapaz de viver?! — Itachi não conseguia entender como alguém podia falar coisas tão horríveis com tanta calma. Ele tentou se aproximar do médico, mas este, percebendo que o caminho até sua cadeira estava livre, apressou-se a voltar ao seu lugar, jogando-se de forma relaxada no encosto.
— Jovem, se você acha que a medicina teria chegado ao nível atual sem a realização de experimentos desumanos em seres humanos, então lamento muito decepcioná-lo. Sacrificando cem pessoas, eu posso criar um remédio que salvará milhões.
— Por que então o senhor não usa pessoas que já não têm futuro, como presos condenados à prisão perpétua? — Itachi se apoiou com as mãos na mesa, inclinando-se sobre ele.
— E você acha que essas pessoas não têm familiares que se importam com elas? Mas eu entendo o seu ponto — Orochimaru fez um gesto com a mão, como se quisesse mostrar que todas aquelas reclamações eram inúteis. — Eu até tentei organizar algo assim, mas surgiram muitas dificuldades com as condições de custódia e o cuidado posterior. Sem contar o controle adicional das forças de segurança, do qual eu definitivamente não preciso.
— Troque ele por mim! Isso é possível? Você o liberta e não conta nada pra ele. Eu fico no lugar dele.
Orochimaru caiu na gargalhada. Quando se acalmou um pouco, disse:
— Um mês atrás, exatamente nesse mesmo lugar, o respeitável Tsukuri me fez o mesmo pedido. E naquela ocasião, em um raro momento de humanidade, eu aceitei sua proposta.
— O quê? Não... — Itachi balançou a cabeça, recusando-se a ouvir aquele veneno que escorria da boca do homem à sua frente. — Isso não pode ser verdade...
— Mais do que isso — continuou Orochimaru, — ao contrário de você, Tsukuri leu o contrato inteiro e assinou ciente de tudo. Aliás, o exemplar assinado por você ainda está comigo — disse ele, remexendo na gaveta inferior da mesa e jogando diante de Itachi uma pilha de folhas com quase meio centímetro de espessura.
Itachi reconheceu o contrato. De fato, ele o assinou, concordando com o estudo que o deixou uma semana internado. Ele até folheou o documento antes de assinar, mas não leu com atenção. Quem perderia tempo lendo quarenta páginas em letras minúsculas depois que o médico explicou em detalhes o que estava escrito ali? Itachi fez uma careta de dor e gemeu.
— O senhor disse que era só uma formalidade... consentimento para exames regulares durante um ano...
— E também disse pra você ler o contrato, cheguei até a sair da sala por um tempo pra não atrapalhar — Orochimaru voltou a fazer um gesto indiferente com a mão. — Mas eu já sabia que você não leria. E foi exatamente o que aconteceu.
Alguém bateu suavemente à porta, e uma enfermeira bem jovem a entreabriu.
— Eu trouxe o paciente.
Orochimaru assentiu com a cabeça, e a moça imediatamente fechou a porta.
— Libere o Deidara ou eu vou ter que levar isso à Justiça — Itachi mordia o lábio com nervosismo, sentindo-se encurralado.
— Vá em frente. Só devo avisar que as audiências podem se estender tranquilamente até o fim do estudo. Duvido que isso ajude você agora. Além disso, a interrupção repentina do tratamento pode prejudicar seriamente o paciente — Orochimaru fez uma careta exageradamente séria antes de continuar: — Mas ainda há uma pequena chance de que, depois de alguns anos de batalha judicial, você vença, receba uma boa indenização e talvez até consiga me colocar atrás das grades — sua voz assumiu um tom ameaçador — impedindo-me de salvar milhões de pessoas do câncer.
Itachi sabia que Orochimaru tinha razão — conseguir uma ordem judicial urgente para interromper a pesquisa seria difícil e levaria tempo, tempo que eles não tinham. Mas ainda assim, ele estava decidido a encontrar um jeito de tirar Deidara dali...
— Quero que me fale sobre o estado dele.
— Você exige informações confidenciais depois de praticamente me declarar seu inimigo? Veja bem, pelas regras da pesquisa clínica, Tsukuri deveria estar internado no hospital. E mesmo assim, eu generosamente permiti que ele ficasse na sua casa, só porque não sou um monstro e compreendo a sua situação — disse Orochimaru, levantando-se da cadeira e se dirigindo à porta, sinalizando que a conversa havia acabado. Ele ia ao encontro do paciente que o esperava no corredor.
DOIS MESES ATRÁS:
O semestre já estava chegando ao fim para Deidara. Ele tinha feito as provas principais e as férias de verão estavam à vista. O sol vibrante da primavera fazia com que ele apertasse os olhos, mas também animava seu humor.
Deidara caminhava apressado pela rua. Embora os dias tivessem esquentado bastante, ele ainda não tinha trocado as botas pretas de cano alto por calçados mais leves. O moletom preto e a cabeleira loira, ondulada, espalhada pelos ombros, já eram praticamente sua marca registrada.
Ele estava com pressa porque Itachi tinha uma cirurgia marcada e queria vê-lo antes, desejar que tudo corresse bem. Mas primeiro, precisava passar rapidamente na casa de Itachi para pegar o livro que já vinha esquecendo de levar há três dias.
Alguns meses atrás, todos os estudantes da universidade foram obrigados a preencher um questionário, a partir do qual apenas algumas pessoas foram convidadas para um exame em um centro médico recém-inaugurado. Apesar de a participação ser voluntária, a diretoria da universidade apresentava isso como uma atividade obrigatória. O que exatamente foi prometido à administração em troca dessa campanha ativa — ninguém sabia, mas os convites para o centro médico eram entregues como uma oportunidade incrível, um prêmio precioso, do qual recusar-se era considerado algo muito ruim. Deidara, fiel à sua imagem de irresponsável, não foi a exame algum, enquanto Itachi, pressionado pelo tutor, acabou aceitando.
A chave que Itachi havia deixado temporariamente com Deidara girou facilmente na fechadura, e a porta da casa se abriu. Dentro, estava silencioso, e os raios de sol desenhavam uma faixa clara no chão do corredor. Deidara já tinha estado ali muitas vezes. Ele e Itachi estavam juntos há mais de um ano. Uchiha sempre insistia para que Deidara se mudasse do alojamento estudantil para morar com ele. Mas o loiro não queria perder sua vaga no quarto. Ele não tinha nenhum parente que pudesse ajudá-lo com dinheiro ou moradia caso algo desse errado, exceto um avô idoso que morava em outra cidade, com quem mal mantinha contato. Itachi também morava sozinho, mas raramente falava sobre a família, e quando falava, era de forma muito relutante. Deidara concluiu que provavelmente havia algum problema com os parentes de Itachi e decidiu não insistir no assunto.
Ele limpou rapidamente os pés no tapete e entrou no cômodo sem tirar os sapatos, indo direto até a estante de livros. Passando o dedo pelas lombadas coloridas, puxou o volume que procurava e já estava prestes a sair, quando notou, sobre a prateleira, uma pilha de papéis com o logotipo do centro médico onde Itachi se encontrava naquele momento.
Sem entender muito bem por que estava fazendo aquilo, Deidara pegou os papéis e começou a folheá-los sem realmente ler com atenção. Pensava que, se não tivesse dormido demais no dia em que deveria ir ao primeiro exame, provavelmente teria um contrato igual àquele em casa. Talvez ele e Itachi estivessem agora no mesmo quarto do hospital... Ou, se Itachi não fosse tão responsável, talvez estivessem passeando juntos em algum parque ou andando de bicicleta por aí...
Uma frase chamou sua atenção: “O paciente é declarado incapaz a partir do início da pesquisa até sua conclusão total.” A formulação soou muito estranha para Deidara, que imediatamente se sentou no chão, cruzando as pernas, espalhando os papéis sobre os joelhos. Sua superhabilidade de causar bagunça ao seu redor se manifestou até mesmo naquele momento. Ao seu redor estavam jogados a mochila largada no chão, os fones de ouvido, as chaves, o celular, o livro...
Quanto mais Deidara lia, mais ficava horrorizado com as condições do contrato. Apressado, olhou a hora na tela do celular e pulou de pé num salto. Tinha se envolvido tanto na leitura dos documentos que agora estava muito, muito atrasado. Antes, ele só queria ver Itachi; agora, era uma questão de urgência perguntar se ele realmente tinha lido aquele contrato e o que aquilo tudo significava.
O loiro correu até a porta da frente, mas então se lembrou de que havia deixado a chave no chão e voltou para pegá-la. Ele queria muito chegar a tempo, então corria empurrando os pedestres nas ruas movimentadas e atravessando os cruzamentos sem esperar o sinal verde.
Finalmente, ao chegar no saguão fresco do centro médico, Deidara, com um movimento já automático, estendeu o passaporte para a funcionária da recepção. A moça franziu a testa, digitou algo no teclado por alguns segundos e devolveu o documento:
— Não é mais possível visitar Uchiha Itachi hoje, ele foi levado para a cirurgia. Volte amanhã; se o médico autorizar visitas, você poderá entrar...
Sem pensar nem por um segundo, o rapaz pulou a catraca e disparou em direção às escadas que levavam aos outros andares. Ir até o quarto de Itachi não fazia sentido, então ele procurava qualquer placa que pudesse guiá-lo até o centro cirúrgico. Não foi difícil, já que o centro era novo e repleto de sinalizações detalhadas por todos os lados.
Quando finalmente encontrou o andar certo, deu de cara com duas portas que levavam às salas de cirurgia. Apenas uma delas estava com a luz acesa. No corredor, começaram a ecoar gritos e passos apressados — era um segurança furioso, acompanhado por algumas mulheres. Lançando um olhar frio para os perseguidores, Deidara empurrou a porta e entrou. Passou por um pequeno compartimento e, ao abrir outra porta, encontrou-se em um ambiente fortemente iluminado e impregnado com cheiro de medicamentos.
Quatro pessoas de máscara, vestidas com aventais cirúrgicos descartáveis, olharam para ele assustadas, levantando os braços de maneira quase cômica.
— Parem a cirurgia! — exclamou o loiro com os olhos febrilmente brilhando, em tom exigente. — O que os senhores pretendem fazer com ele? Eu não vou permitir que o transformem em um inválido!
A porta da sala cirúrgica se abriu novamente e alguém agarrou o braço de Deidara por trás, tentando torcê-lo para as costas. O loiro começou a se debater. Então, um dos profissionais de branco abaixou a máscara até o queixo e ordenou com calma:
— Esperem, soltem-no. Só falta ele destruir tudo aqui dentro — e, ao encontrar o olhar de Deidara, continuou sem qualquer irritação: — Jovem, proponho que conversemos com calma no meu consultório. Esta é uma sala estéril e o senhor não pode permanecer aqui.
Ao notar a hesitação no rosto do loiro, o médico apontou para a porta e acrescentou:
— Espere por mim no corredor, será apenas um minuto.
— Eu não vou permitir que continuem com essa operação! — disse Deidara com firmeza, ainda que o tom sereno do médico o deixasse um pouco desconcertado.
— Eu sou o cirurgião. Sem mim, nada continuará — respondeu o médico, passando para o compartimento e tirando o avental. — Vamos...
O resultado da conversa foi apenas um único pedido:
— Senhor Orochimaru, só não conte nada disso ao Itachi. Eu não quero que ele saiba…