Capítulo 1
29 de agosto de 2025 às 00:46
O vento frio de Godric’s Hollow batia contra as janelas da casa dos Potter.
James, ainda adolescente, andava de um lado para o outro no quarto, a varinha girando nervosa entre os dedos.
Fleamont Potter, já grisalho, mas ainda com o brilho travesso no olhar que o tempo não apagou, encostou no batente da porta, cruzando os braços. Ficou ali por um momento, apenas observando o filho como quem já conhecia todos os pensamentos que borbulhavam naquela cabeça.
— Vai furar o chão de tanto andar, Jamesinho. — A voz do pai tinha aquela ironia suave que era quase um abraço.
James bufou e largou-se na cama.
— Não consigo parar de pensar, pai.
— Sobre Lily Evans, imagino? — Fleamont sorriu de canto.
James virou-se num pulo.
— Como você…
— Filho, eu já tive a sua idade. Reconheço o jeito de quem descobriu o frio na barriga.
James apertou o travesseiro contra o rosto, abafando o som de um grunhido.
— Ela é diferente, pai. Todo mundo acha que eu só quero zoar, que sou arrogante, que não levo nada a sério… mas quando se trata dela, eu… eu não sei ser eu mesmo.
Fleamont caminhou até a cama e sentou-se ao lado do filho, devagar, como se fosse um ritual.
— Isso se chama paixão. E não se assuste, James, porque paixão nunca vem com manual de instruções. É fogo que esquenta e assusta ao mesmo tempo.
O garoto ficou em silêncio. O medo estampado nos olhos, mas também aquela coragem de quem adorava um desafio.
— E se ela nunca gostar de mim de verdade?
O pai pousou a mão no ombro dele.
— Amar é sempre um risco. É como voar sem as mãos na vassoura. Você pode cair. Mas se nunca tentar, nunca vai saber o gosto do vento no rosto.
James abaixou o olhar, pensativo. Fleamont, então, suspirou fundo, como quem via no filho um reflexo distante de si mesmo.
— Quando conheci sua mãe, pensei que não teria a menor chance. — Ele riu, lembrando-se. — Ela era brilhante, generosa, bonita… e eu, um completo desastre na frente dela.
James ergueu os olhos.
— Sério? Você?
— Claro! — Fleamont riu alto. — Até que um dia, em vez de tentar impressioná-la, eu apenas sentei ao lado dela e ouvi sua risada. E naquele instante soube que não precisava de truques, só de verdade.
O silêncio caiu de novo, mas era diferente. James respirava mais fundo, absorvendo as palavras como quem colecionava uma herança invisível.
— Então você acha que devo tentar? — perguntou baixo.
— Acho que você já tentou, filho. — Fleamont bagunçou os cabelos desgrenhados do garoto. — O resto é deixar o jogo acontecer.
James riu, nervoso, mas havia um brilho novo nos olhos. O pai o puxou num abraço rápido, forte e caloroso.
✨ E naquele aperto, James não percebeu que o conselho era mais do que simples palavras: era uma despedida disfarçada de bênção. Fleamont não sabia quanto tempo teria ao lado do filho, mas sabia que cada riso, cada lição e cada conversa seria guardada dentro dele, pronta para guiá-lo mesmo quando não pudesse estar por perto.
No fundo, era esse o segredo que os Potter sempre carregaram: a coragem de se jogar no escuro, confiando que o amor — seja de uma mulher ruiva de olhos intensos ou de um pai que acreditava no futuro — era a única magia que realmente valia a pena.
O luar entrava pela janela da casa em Godric’s Hollow, iluminando o berço onde Harry dormia, respirando miúdo, como se o mundo inteiro fosse calmo e seguro.
James estava em pé, observando o filho, os óculos escorregando um pouco no nariz. Lily já dormia no quarto ao lado, exausta depois de mais um dia.
E foi nesse silêncio que a lembrança voltou.
O quarto de adolescente, a varinha girando nervosa nos dedos, o coração disparado só de pensar em Lily Evans… e o pai sentado ao seu lado, dizendo que amar era como voar sem as mãos na vassoura: arriscado, mas a única maneira de sentir o gosto do vento.
James sorriu de leve, os olhos marejados.
— Você tinha razão, pai — sussurrou para o vazio. — Só ganha quem se arrisca.
Ele se abaixou, ajeitou a manta no berço e deixou um beijo na testa do filho.
Harry se mexeu, soltou um suspiro leve, e James sentiu aquele frio na barriga outra vez — o mesmo de antes, só que agora não era medo, era amor multiplicado.
Era isso o que o pai quis dizer, percebeu. O risco valia a pena porque o amor nunca se perdia: ele se transformava, se espalhava, e encontrava novos jeitos de existir.
Naquele instante, James Potter não era só marido, nem só pai.
Era também filho — ainda guardando dentro de si a voz do homem que o ensinou que amar, no fim das contas, era a única coisa que realmente importava.