Capítulo 1
10 de abril de 2025 às 16:34
A noite se aproximava. Montaram as barracas, só faltava juntar lenha e acender a fogueira, sorte que na taiga isso não faltava. O verão na Sibéria pode ser quente, mas ao anoitecer esfria, e dava vontade de se aquecer.
— Fica aqui nas barracas, eu vou buscar lenha.
— Espera, não vai!
— Relaxa, Rusik, qual é o problema?
— Ursos... — respondeu Ruslan com voz tensa, seus olhos claramente cheios de medo.
— Tá com medo de urso? Acha que pra um cara da Sibéria isso não é meio exagerado?
— Eu não tô com medo! Eles são perigosos mesmo! É você que me preocupa!
— Tá óbvio que você tá com medo! — Dugar não parava.
— Não tô! Se eu tenho medo de algo, é do seu bagre. Isso sim, que porra é essa? Meio lagosta, meio pinto?
— Para de encher o saco! É só um tigre, a gente tá falando de ursos ou não? — ele se agachou perto de Ruslan, sentado num tronco. — Você sabe que ursos são animais diurnos, né? Dormem de noite, e de dia você não tem medo. Eles têm medo de fogo, então fica na barraca enquanto eu vou pegar lenha.
Dugar foi embora, e Ruslan ficou sozinho. De novo... Ele odiava a solidão e o silêncio, odiava aquela taiga infinita, vazia e sem vida com toda a alma. As palavras de Irkutsk o aliviaram um pouco, mas o silêncio ensurdecedor trazia à tona milhões de pensamentos insuportáveis. Para abafar o barulho, Ruslan recitava poemas, pelo menos isso ajudava a afastar os pensamentos obsessivos.
*"Quantos séculos, ó águas do Yenisei,*
*Rolais das montanhas Sayan, onda após onda,*
*Nós, os krasnoyarskianos, pelo nosso rio*
*Abraçamos o país até o oceano.*
*Até o oceano abraçamos...*
*Quantos séculos, ó águas*
*Do Yenisei..."*
Quando não adiantava, ele lia em voz alta, cada vez mais alto.
Quando Dugar saiu, ainda estava claro, mas parecia que já tinha passado meia hora, uma, duas, e ele não voltava. E além disso, sem ele, não haveria fogo.
Felizmente, Irkutsk não demorou muito. Acenderam a fogueira, e Ruslan se sentiu mais calmo. Mesmo no meio da taiga escura e sem fim.
Já estava completamente escuro.
— Você nunca me disse que tinha medo de ursos, achei que gostava deles. Fomos ao circo ver os ursos, pensei que tinha gostado.
— Bem... Não exatamente. — Ruslan ficou em silêncio.
— Mas o que aconteceu? Deve ter algum motivo, né? Eles nem podem te fazer nada! Ou um urso já te mordeu?
— Como te dizer...
— Fala a verdade.
— O que você quer que eu diga!? — ele gritou, sem aguentar mais. — Eu nem lembro direito! O cérebro às vezes apaga memórias ruins, já ouviu falar?
— E não lembra nada mesmo? Desculpa se for indelicado, mas falar ajuda.
— Lembra nos anos 700, quando você veio me visitar e seu cavalo morreu? — Dugar acenou afirmativamente. — Pois é. Eu te dei o meu cavalo e voltei a pé pela floresta...
Krasnoyarsk ia continuar, mas foi interrompido.
— Meu Deus, Rusik, pode parar, entendi...
— Eu nem lembro do resto. Só de dois idiotas a cavalo que me abandonaram, nem lembro os nomes...
— Me desculpa, não devia ter aceitado seu cavalo.
— Não foi culpa sua, fui eu que ofereci... Se não, teriam comido o cavalo também, e ele não sabe regenerar braços. — a última frase foi dita com uma zombaria amigável, mas logo o riso se transformou numa tosse rouca. Pena que os pulmões não se regeneram tão fácil.
O chá naquela noite estava especialmente gostoso.